terça-feira, 16 de setembro de 2008

Entrevista com Kalil pelo Jornal o Tempo.

http://www.otempo.com.br/otempo/noticias/?IdNoticia=44059

ENTREVISTA - Kalil põe a boca no mundo

Ex-dirigente diz que não faz parte dos homens que levaram o Atlético para a segunda divisão e aponta seus erros no clube.

CÂNDIDO HENRIQUE SILVA/PEDRO BLANK

Alexandre Kalil reluta em conceder entrevistas, afinal, sabe que qualquer declaração sua mexe com os atleticanos. Nas conversas da equipe de O TEMPO para o agendamento da conversa, ainda por telefone, disse que topava falar para provar a distância que o separa dos "homens que levaram o Atlético para a segunda divisão".

No encontro que durou quase uma hora na sede de sua empresa de engenharia civil, não se recusou a responder nada. Só não citou nominalmente quem seriam os responsáveis pela degringolada do Atlético.

"É só olhar os coveiros. Vocês são jornalista e basta olhar quem levou o Atlético para segunda divisão", afirmou.

De memória, é possível responder Kalil. Quem comandava o Atlético na queda para a Série B, em 2005, e exercia influência no futebol eram o presidente Ricardo Guimarães e o vice-presidente de futebol, Sérgio Coelho.

Resposta dada e, claro, Kalil fica quieto ao ser indagado se os nomes eram esses. Sentado numa mesa com vários escudos do Atlético e tendo uma fotografia da torcida cruzeirense estendendo uma faixa com palavras obscenas a ele, Kalil esmiúça o Atlético e o futebol. Como de costume, não escolhe meias palavras.

Fala de bate-pronto. E, como ele mesmo diz, não há off. Tudo pode ser publicado. Afastado há quase um ano do conselho deliberativo, Kalil faz questão de assumir sozinho a responsabilidade pela contratação fracassada de Alex Alves.

A dispensa do meia Ramon, a redução de salários e as ações do Galo na Justiça também recebem comentários do ex-cartola mais querido e ao mesmo tempo mais odiado pelos torcedores mineiros.

O TEMPO - Como o senhor avalia esse desequilíbrio financeiro nas contas do Atlético" De quem é a culpa" Alexandre Kalil:

O Atlético foi entregue em 1985 sem dever um tostão, inclusive de imposto. Depois os presidentes foram vendendo quilos de jogador para o exterior. Quilos.

Venderam uns 20 para a Europa. Foi Moacir, Cléber, Renato Morungaba, Airton e não conseguiram sanear o Atlético.

De 85 para cá, aconteceu isso tudo. Agora, o Atlético tem uma dívida fiscal. Com a dívida bancária, o grande problema do Atlético foi ter crédito. Quem não tem (crédito) não precisa se inviabilizar.

O senhor saiu no começo de 2000 e voltou em 2001. Ficou assustado com a situação que encontrou"
Eu fiquei. Em 2001, fomos assistir um jogo do Atlético e ele perdeu de 4 a 0 para o Villa Nova, no Independência. Eu abaixei na bancada e falei com o Ricardo (Guimarães, presidente): "Ricardo, estamos liquidados. Esse time não chega em lugar nenhum".

E financeiramente"
Tínhamos sete meses de salários atrasados em 2001. Botamos em dia esse salário porque fomos viabilizando. O Atlético tem que ser tocado é no Clube dos 13, fora da sede de Lourdes. É no eixo onde se busca o dinheiro, não no banco.

Futebol busca dinheiro é na mídia. Nós não tínhamos nenhum grande volume de dinheiro colocado dentro do Atlético.

Desde que saiu do Atlético, há três anos, o senhor se afastou totalmente da vida administrativa do clube"
Completamente. Mas começaram a colocar meu nome no balaio, eu fui à Justiça do Trabalho e está aqui: 207 ações, sendo 185 de três anos para cá.

Eu tinha 15 ações trabalhistas e apenas seis de jogador. Hoje, tem 207 (ações), então não me coloca nisso. Se você perguntar se o Ramon é culpa minha, eu digo que é. Mas isso aqui não é. Ir para a segunda divisão não é.

O senhor foi difamado"
O Atlético passou a ter um negócio de vice-presidente de futebol dar entrevista, aparecer em jornal e puxar placa. Ele trouxe jogadores. Falar que o Emerson, o Nilson Sergipano, o Mexerica, o Jales é culpa minha é sacanagem. Jales, no meu tempo, não limpava o chão da sede.

Comente sua decisão de abaixar os salários dos jogadores.
Havia contratos de R$ 180 mil que não fui eu quem fiz. Eu não posso pagar a um jogador R$ 180 mil. Não foi uma decisão irresponsável. Todos aceitaram a redução, que não é de salário porque salário não se abaixa. A lei não permite.

Era de empresas que eles fazem para direito de arena para burlar o fisco. Então, abaixamos contratos de empresas. Não foi feito nada de orelhada. Dos 35 jogadores que tínhamos, apenas o senhor Edgard entrou na Justiça.

O Ramon ganhou na Justiça cerca de R$ 3 milhões do Atlético. O senhor participou ativamente do afastamento dele em virtude de atritos com o técnico Levir Culpi. Por isso, é uma responsabilidade sua"
É minha. O Ramon saiu do Atlético com salário em dia, abandonou o emprego, pois o contrato dele não rezava que tinha que ser titular. Quebrou a hierarquia do clube e está ganhando dinheiro do Atlético na Justiça.

Corre o boato de que o senhor teria contratado o Alex Alves para fazer raiva no Zezé Perrella. É verdade"
Absolutamente mentiroso. O Zezé Perrella não tem nada com isso. Fomos no maior sigilo à Alemanha.

Foi um pedido do Celso Roth e o Alex Alves veio de graça. O clube que levou o Alessandro Cambalhota pagou o Hertha Berlim. Eu sei que o Alessandro e o Alex Alves vieram de graça.

O Atlético lhe deve alguma coisa"
Nada. Nenhum tostão. Não me deve nada. E eu nunca tirei dinheiro da minha empresa para o Atlético. O que eu fiz foi usar o meu aval para o Atlético e mais nada.

Há um relatório do conselho deliberativo apresentado em dezembro de 2005 que mostra que uma das empresas que teriam a receber do Atlético seria a Erkal, cujo proprietário é o senhor...
Isso foi simplesmente aval bancário. Eu tenho todos os contratos casados com o banco. Eu tomei dinheiro do Atlético na mesma tarde, e tenho tudo documentado, e emprestei para clube. O dinheiro não parou aqui dentro um minuto. A taxa que o banco me cobrou é a taxa que eu cobrei do Atlético.

Procede a versão de que numa reunião do conselho o senhor teria dito que o Atlético não poderia mais pegar dinheiro emprestado com Ricardo Guimarães"
Não. O que nós deliberamos é que o Atlético não pagaria o Ricardo Guimarães sem uma comissão. Isso foi deliberado pelo conselho. Se o Atlético, hoje, quiser pagar o Ricardo, tem que passar por uma comissão que foi formada.

O senhor tem conhecimento de alguma proposta de o Atlético ceder o shopping DiamondMall para o ex-presidente Ricardo Guimarães"
Somente se eu estiver debaixo da terra. Não é para o Ricardo. É para qualquer um. O shopping do Atlético é patrimônio maior que o Atlético tem. O shopping é do Atlético e vai voltar para o Atlético.

Enquanto o senhor esteve à frente do futebol, quais foram as principais negociações envolvendo transferências de jogadores"
Vendi o Lincoln para o Kaiserslautern e o Gilberto Silva para o Arsenal. Eu estou falando eu porque fui sozinho lá vender. O que saiu de lá entrou aqui.

Não tem esse negócio de, no meio do caminho, sumir 10% ou 15%. Nós vendemos R$ 40 milhões em jogador. Eu vendia bem.

Como foram usados esses recursos"
Tudo utilizado para abater nas dívidas. Nada foi investido em jogador, em contratação ou em centro de treinamento.

O dinheiro do CT, nós fizemos uma engenharia econômica com a Umbro, que era nossa patrocinadora, e o dinheiro iria direto para a construtora.

Entregamos pronto. Eu saí do Atlético e aquilo estava prontinho, só faltando uma rede tubular embaixo do hotel e mobiliar. O resto foi tudo entregue antes de sair do Atlético.

Quem são os culpados pela crise que se instalou no Atlético"
Vejam quem jogou o Atlético para segunda divisão. Os coveiros. Tem gente que está agarrado até hoje. Não tem cargo, não tem nada.

Não sei que mistério é esse. Mas tem gente que agarra a pasta e não solta o osso. É muita paixão pelo Atlético. Tentou ser tudo, não é nada, mas está agarrado.

O senhor pode comentar se o contrato entre Atlético e a empresa que administra o shopping DiamondMall é lesivo aos cofres do clube"
O Sérgio Sette Câmara, o Carlos Goulart e a equipe de advogados que trabalhavam conosco ferveram no shopping atrás do dinheiro.

Isso só nasceu na nossa época lá. O que o shopping faz com o Atlético é uma indecência. O Atlético está sendo gravemente lesado.

Então o acordo é ruim"
O shopping cobra estacionamento depois do contrato e o Atlético não recebe nada. Faz outro andar e o Atlético não recebe nada.

No Natal, o faturamento triplica e o Atlético não recebe nada. Luvas de lojista, o Atlético não recebe nada. É o pior negócio do mundo. Se tem dono, o dono está bilionário. É uma aberração.

Qual o caminho a ser seguido pelo Atlético"
O Atlético se resolve é fora da sede de Lourdes. Ficamos três anos sem fazer uma reunião de diretoria. Tudo que era resolvido e importante para o Atlético era com um telefonema de cinco minutos. O departamento jurídico fazendo contrato e o departamento técnico trabalhando. Agora, decisão não se toma em reuniãozinha.

O Atlético tem que sair. Tem que ir para o eixo buscar dinheiro. Participar, não. Liderar. Porque nós lideramos. Nós lideramos a liga do futebol brasileiro e o Clube dos 13. O Atlético foi vanguarda em matéria de futebol nesses três anos em que trabalhei.

É preciso sonhar alto"
No meu tempo, o São Paulo era freguês. O São Paulo nunca chegou à frente do Atlético comigo. Tem que pensar grande na hora de fazer um pacote com a televisão o ano inteiro.

Não me venham dar migalha para Atlético, Cruzeiro, Atlético-PR, Grêmio e Internacional.

Falta peito dos dirigentes para criar a Liga do Futebol Brasileiro e parar o Brasileirão, por exemplo"
Se o Cruzeiro não anda para trás e abraça o Ricardo Teixeira, a Liga do Futebol Brasileiro estava pronta. Quem tem que cuidar do dinheiro do futebol é o clube.

O Cruzeiro roeu a corda"
Isso é público. É só ver as notícias da época. Agora estão penando e têm que pegar o São Paulo com R$ 20 milhões a mais no bolso.

Temos que disputar o Brasileiro igual com eles. O futebol brasileiro vai acabar, vai virar futebol europeu. Vai ter quatro a cinco times. Porque estão matando

Paraná, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Só não vê isso quem é cego. Eu não era contra o Estadual e nem sou. A liga hoje, se corrigindo o contrato, era coisa de R$ 10 milhões a R$ 12 milhões para o Atlético.

O Atlético está recebendo R$ 800 mil a R$ 1 milhão no Mineiro. É piada. O Atlético tem que contratar qualquer um. Enquanto eles trazem Zé Roberto, Nilmar e outros.

Quem seria o presidente da liga"
Para nós conseguirmos o apoio do Clube dos 13, prometemos a presidência para o senhor Fábio Koff. Ele foi o primeiro que traiu. Antes, o Fábio Koff era um homem que tinha currículo e agora tem folha corrida.

Com a desistência da liga e a sua saída, o Atlético fez as pazes com a CBF. Foi algo bom"
O Atlético caiu para a segunda divisão abraçadinho com a CBF. Enquanto nós éramos brigados, não perdemos nada.

Quando ficamos amiguinhos é que nós fomos para a segunda. Brigar com a CBF não é ruim. Ruim é ser amigo. O Atlético é grande amigo. O Atlético foi para a Série B sendo roubado.

Qual a pior administração da história do Atlético"
Tenho a minha opinião e prefiro não dar. Opinião é coisa leviana.

Por que o senhor deixou o Atlético"
Eu saí porque o Atlético participou de uma reunião, que eu não sabia, para paralisar o Campeonato Brasileiro. Eu não aceitei.

No auge da minha briga com a CBF, eu não iria aceitar fazer um acordo com o Ricardo Teixeira para chutar um estatuto (Estatuto do Torcedor) que é a única coisa boa que tem no futebol.


Publicado em: 31/03/2007

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